domingo, 21 de julho de 2013

A CAPTURA DE JOÃO ARAPUÁ


A seca de 1877 foi a mais severa estiagem de todos os tempos, milhares de pessoas perderam suas vidas em todo Nordeste. No Ceará, famílias inteiras fugiam de suas terras em busca de sobrevivência em outros lugares. O Sítio Cachimbo, encravado na grota do Espírito Santo no recém criado município de São Pedro do Cariri (atual Caririaçu-Ce) foi palco de um triste episódio, onde praticamente uma família inteira - oriunda do sertão do Jaguaribe - foi dizimada pela fome.

Com o passar da estiagem Bartholomeu Ferreira resolve vistoriar as terras da família e pega o Caminho a cavalo seguindo o Rio São Lourenço e Riacho Comprido subindo o trajeto até o Cachimbo e chegando lá, de longe, percebe a movimentação estranha de um menino de aproximadamente treze anos de idade entrando no mato e desaparecendo no meio da caatinga.  O velho Berto imediatamente recua, e em dado momento retorna e esconde o cavalo debaixo de uma frondosa árvore e depois fica do alto de um serrote observando e esperando a tarde inteira a suposta reaparição do jovem.

O sol já está quase sumindo quando o menino de cor preta e cabelo crespo chega de mansinho e fica distraído observando a paisagem. Enquanto isso Bartholomeu percebendo a forma primitiva de vida do jovem, prefere ter paciência e procura entender se ali existiam outros indivíduos em sua companhia, percebendo depois com o passar do tempo, já totalmente escuro, que se tratava de um único exemplar.

A idéia que vinha na cabeça era pegar o menino. Fazer como se faz com um animal selvagem. Talvez o momento fosse único e não podia ser desperdiçado. Até que em um dado momento o negrinho se aproxima e entra na boca de um forno velho desativado, como se lá fosse sua cama. O experiente sertanejo prefere aguardar um pouco para dar o bote, depois se aproxima, prepara o ataque e se agarra com a presa. O menino assustado retruca, dar pinotes, berra, tenta soltar-se, mais acaba se rendendo depois de amarrado.  Bartholomeu, sua esposa Madalena e os filhos recebem com carinho o menino, ele cresce tornando-se depois uma pessoa de confiança da família, ajudando nas lidas diárias e convivendo harmoniosamente com a comunidade. Relatou depois que seu nome era João e que foi o único que escapara de uma numerosa família que estava convivendo na Grota do Cachimbo depois de viajar várias léguas desde a região do Jaguaribe em busca de terras férteis no Cariri. Talvez, por ter o cabelo bastante embaraçado acabara sendo apelidado de João Arapuá.

Anos depois o jovem retornou ao Cachimbo fortemente armado acompanhando Bartolomeu no episódio bastante conhecido quando o Coronel Belém do Crato tentou demarcar indevidamente as terras do São Lourenço e foi interrompido graças à resistência da comunidade.






domingo, 14 de julho de 2013

PREFEITO JOÃO MARCOS PEREIRA

João Marcos Pereira nasceu em 19 de dezembro de 1965, no Sítio Barra da Carnaúba no município de Caririaçu Ceará, sendo o décimo segundo filho do casal de agricultores Antônio Alves da Cunha e Maria Antônia Alves da Cunha (Dona Lia), cresceu com seus irmãos ajudando os pais na lida diária da roça, como a maioria das famílias daquela época. Com aproximadamente oito anos de idade, foi morar com os irmãos mais velhos na vizinha cidade de Juazeiro do Norte com a finalidade de estudar. O menino percebendo a necessidade de ajudar a família resolveu também trabalhar, em um dos seus primeiros “empregos”, entregava feiras de clientes em domicilio, nesta época ele pôde comprar seu primeiro par de sapatos. Aos dezenove anos casou-se com a jovem Wenysleyk Pontes Matias (Aninha) com que teve seus dois filhos Wantuil Matias Neto (Dr. Neto) e Natalia Matias Pereira graduanda em Administração de Empresas. A vocação de empreendedor foi se confirmando com seu primeiro negócio um comércio de cereais. Mas como muitos nordestinos, João Marcos resolveu buscar melhores oportunidades em outros estados brasileiros, tendo empreendido atividades comerciais em Porto Velho – Rondônia e em Petrolina – Pernambuco. Porém em 1998 retornou a Juazeiro do Norte com o propósito de instalar uma fabrica de joias foleadas, foi então que inovou com a criação dos Kites de joias, onde montou varias equipes de vendedores que passaram a viajar pelo Brasil, vendendo estes kites que se consolidaram, gerando empregos para mais de 500 pessoas inclusive para seus conterrâneos caririaçuenses. Com o sucesso de suas empresas João Marcos resolveu retornar a Caririaçu onde adquiriu uma propriedade e passou a residir. Convidado por políticos locais filiou-se ao Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) e em 2004 foi escolhido pelo partido como candidato a prefeito do município, em uma campanha bem disputada atingiu 45,099% dos votos válidos não conseguindo a eleição. Contudo, continuou sua caminhada, e vislumbrando a possibilidade de um novo empreendimento, passou a investir em imóveis e assim abriu sua nova empresa, desta vez no ramo imobiliário, com a abertura de loteamentos em Caririaçu trazendo para seus conterrâneos a oportunidade de adquirirem seus imóveis através de compras parceladas tornando-se o pioneiro nesta atividade em sua terra natal. Mais tarte expandiu essa atividade para outras cidades como: Várzea Alegre, Barro e Araripe. Em 2008, já filiado a Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), entra mais uma vez na disputa eleitoral pela Prefeitura Municipal de Caririaçu desta vez como candidato a vice prefeito junto a candidata a prefeita Lucia Vanda, a dupla atinge o número de 7.011 votos, correspondendo a 43,34% não alcançando seus objetivos, esse fato não o desestimulou e João Marcos continua suas atividades no senário político de local. Determinado a trabalhar por melhores condições de vida para seus irmão caririaçuenses, continuou sua atuação no meio político, ganhando cada vez mais a credibilidade do povo quando resolveu em 2010, apoiar as candidaturas a Deputado Estadual, Federal, Governador, Senador e Presidente da Republica dos respectivos candidatos: Camilo Santana, Daniel Oliveira, Genecias Noronha, Eunício Oliveira Pimentel, Cid Gomes e Dilma Rusefe. João Marcos e seus correligionários alcançaram expressiva votação para seus candidatos o que o colocou em maior evidência como liderança política. João Marcos passou a contar com o apoio destas lideranças políticas nas esferas estaduais e federais, bem como recebeu a adesão de lideranças locais, sendo portanto aclamado como candidato a prefeito para as eleições de 2012 pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMBD). Com uma campanha baseada em propostas para um governo inovador e participativo sua coligação ganhou o apoio popular o que lhes conferiu êxito nesta disputa, atingindo o resultado de 9.080 votos o que representa 52,65% dos votos válidos. Com uma visão inovadora de gestão pública, João Marcos pretende alavancar o desenvolvimento de Caririaçu transformando seu crescimento econômico em qualidade de vida para sua população. Fonte:http:www.caririacu.ce.gov.br

segunda-feira, 2 de abril de 2012

O vaqueiro Marquinhos do Olho D’água

Conhecemos de perto a história de Marquinhos do Olho D’Água, nasceu no sítio Carnaúba dos Marcos, divisa dos municípios de Farias Brito, Crato e São Pedro do Cariri, hoje Caririaçu. Filho de Marcos Pereira Neto e Antonia Clarinda de Jesus, o pai morreu encourado no lombo de um cavalo enquanto pegava um boi no sítio Olho D’água das Cacimbas no início da segunda década do século passado. Conforme relatos dos mais antigos o jovem teria saído da Carnaúba tangendo gado juntamente com outro vaqueiro e teve morte súbita ainda montado. Naquele momento calava-se o aboio de um dos homens de maior coragem da região. Sua irmã Joana, casada com o Major Simplício Gonçalo, muito triste com a notícia solicitou que os moradores da fazenda se preparassem para buscar o corpo, e também ordenou imediatamente que outro empregado fosse levar a triste notícia aos familiares da Carnaúba e do Bom Jesus. Em pouco tempo todo o Vale do São Lourenço e a região de Todos os Santos ficou sabendo do ocorrido. Marquinhos, o único filho, tinha apenas um ano de idade e viveu praticamente toda infância sob os cuidados de sua avó materna Dona Cota no Sítio Olho D’água.

Contou-nos Marquinhos que sua mãe ao ficar viúva casou-se com Pedro Ferreira, ao qual o menino passou a tê-lo como pai. Segundo ele, aos onze anos de idade, com a morte da mãe, apesar do padrasto ser uma pessoa muito bondosa, aproveitou uma viagem que o mesmo teria feito a cidade de Aurora onde tinha negócios com um comerciante local e preparou seu cavalinho, vestiu duas roupas, uma sobre a outra e pegou a estrada com destino a casa da avó. No caminho, ao passar na frente da casa da tia Raquel, irmã de sua mãe, não quis conversa ao ser indagado pelo primo Marcos Gonçalo que desconfiado da atitude suspeita queria saber para onde ele ia, e com a falta de resposta imediatamente mandou que um empregado selasse um cavalo e saiu seguindo a trilha do pequeno vaqueiro até a casa da avó para certificar-se do acontecido.

A infância e a juventude de Marquinhos foram vigiadas pela avó e os tios que sempre o trataram com muito amor procurando sempre ensinar a piedade e devoção aos princípios da igreja cristã. Teve uma vida muito próxima dos parentes, participando das festas de casamento, cantorias, renovações e missas principalmente nas comunidades de São Lourenço, Cacimbas, Olho D’água, Todos os Santos, São Sebastião, Bom Jesus e Carnaúba.

Na condução do gado tornou-se pessoa de confiança do Major Simplício Gonçalo, juntamente com outros vaqueiros afamados como o primo e amigo José Gomes. É reconhecido como sendo um autentico vaqueiro sertanejo, o livro “Festa de Apartação – A Vaquejada” da poetisa e escritora cariririense, Alda Cordeiro, natural da fazenda Olho D’água de Santa Bárbara, sopé da Chapada do Araripe, Nova Olinda – CE, registra a façanha de vaqueiros afamados da região. Na relação dos homens do gado é citado o nome de Marcos Pereira da Fazenda Cacimbas e seu fiel companheiro cavalo Asa Branca.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

NOTICIAS DE CARIRIAÇU

Edição da Revista Região em 29 de Janeiro de 2012. Traz informações sobre a administração do então prefeito Raimundo Rodrigues Sobrinho e imagens de Marcos Gonçalo Neto e Gregório Alves da Cunha,pai e filho mortos em desastre automobilístico no dia 18 de outubro de 1981 quando retornavam de uma visita a familiares no sítio São Lourenço. Primeiramente aconteceu um acidente na Serra dos Pilões a 10 quilômetros de Caririaçu, onde faleceu Gregório que era vereador. Infelizmente, o veículo que prestou os primeiros socorros às vitimas acabou capotando próximo a cidade de Juazeiro do Norte e vitimou o jovem de apenas 18 anos Marcos Gonçalo, que era estudante, funcionário público e correspondente do Jornal O Povo de Fortaleza.

sábado, 21 de janeiro de 2012

DO COURO AO CARRINHO DE MÃO

Em tempos de dificuldades e pouca tecnologia, o homem do campo improvisava o que dispunha para realização das atividades diárias e a solução de problemas ligados aos trabalhos domésticos na roça ou na condução do rebanho.
Encontramos ainda vestígios desse tempo, onde o couro era um produto de grande valor, sobretudo porque era usado de forma variada na fabricação de móveis, vestuários, celas e utensílios, construção civil e diversos produtos artesanais.
No sítio Cacimbas temos alguns açudes que foram construídos através do trabalho braçal de homens que usavam técnicas ultrapassadas para os dias de hoje, mas de grande serventia antigamente até as primeiras décadas do século passado.
A construção dos reservatórios, com a falta de tratores, ou mesmo de carrinhos de mão, era feita com couro de gado estirado e puxado por uma junta de bois.
Conforme Antonio Campos da Silva, agricultor aposentado que mora na sede do município de Caririaçu, o finado Zuza Pereira, da família dos Anjos da Cachoeirinha, exímio artesão, começou a construir carinhos de mão tailados na madeira com uma qualidade muito boa capaz de carregar água sem que houvesse sequer um mínimo vazamento. Com isso, os proprietários de terra, aos poucos constataram a necessidade de substituir o velho costume pela técnica inovadora.
Anos depois, com a inclusão das frentes de serviços de emergência pelos governos – onde os sertanejos alistados no projeto formavam grandes formigueiros humanos numa busca constante em nome da sobrevivência, passando por todos os tipos de humilhação e sofrimento - o carrinho de mão feito de ferro foi bastante difundido na construção de açudes.

Despachos e Catimbós de Frei Junípero - por José Maria Vasconcelos


Convento de São Benedito - Teresina/PI

Na década de 1950, Teresina, de uns 100 mil habitantes, praticamente acabava no Aeroporto, Buenos Aires, Iate Clube, final da Avenida Frei Serafim com o Rio Poti, Vermelha, Piçarra. Aos domingos, a partir das 4 da madrugada, a cidade, tocada pelos românticos sinos da Igreja S. Benedito, quebrava o gélido silêncio para a missa das cinco. Meu pai, Martinho, montava a criança na garupa da bicicleta, partíamos da distante Piçarra para o dever dominical. Bundinha penava no trépido calçamento da Avenida Frei Serafim.

Eu me sentava próximo ao altar. Encantavam-me os lampadários acesos, as dezenas de figuras pintadas na abóbada do templo, o coreto elevado no fundo da igreja, ao som do teclado e muitas vozes. Ao lado do altar, Frei Junípero, baixinho, gordo, barbicha, olhos asiáticos e agitados, irmão leigo, sem letras, sem sacerdócio, batina surrada, terço nas mãos, ajoelhado, extremamente ingênuo e atabalhoado, sempre atento às coisas e criaturas estranhas por perto. Ai de quem se ajoelhasse por trás do frade, ele mirava o malvado, sentia agourentos presságios: “Sai daqui, seu catimbó!” Naquela época, empurrão de padre ou de gente velha valia como lição de vida. Todo mundo suportava.

Os sacerdotes do Convento S. Benedito divertiam-se com as catimbas de Frei Junípero. Bastava um guarda-chuva escancarado, no tablado de madeira do andar superior do convento, para Frei junípero desesperar-se, acender velas, espalhar sal, detonar a fúria paranoica. Certo dia, quase lincha Frei Virgílio, que lhe colocara um pano preto à porta da cela. Frei Junípero enfureceu-se, bateu-lhe com as sandálias e enterrou um feitiço na horta.

Nesta semana, Frei Hermínio, residindo em Roma, contou-me por email, que o esquizofrênico frade, uma vez, no Convento de S. Sebastião, em Parnaíba, danara-se com sacerdote que cultivava uma trepadeira mui florida. De madrugada, Frei Junípero dirigiu-se ao pomar, cortou as raízes da planta, enterrando a ponta do caule com algum feitiço. A coitada murchou, espantando catimbó, aliviando pobre frade.

Se você pensa que mosteiros só abrigam santinhos e angelicais figuras de carne e osso, engana-se. As clausuras também se iluminam de luzes infernais. Se o demônio tentou Eva, em jardim paradisíaco, e Jesus, na gruta do jejum, imagine frades, freiras e pastores. Nós, emplumados de hipocrisia farisaica, especialmente apontando escândalos do clero, esquecemos safadezas e corrupções, no território familiar e profissional.

Quando abordo trapalhadas e catimbozeiras em redor do altar, não tento tripudiar a fragilidade humana, seja padre ou freira, personagens da minha estimação literária, pela convivência feliz com essa gente, que me abriu veredas do bem, mesmo me apavorando com velas pretas.

Frei Junípero faleceu em 1986, em Juazeiro do Norte, terra de seu apaixonado Padim Ciço, a quem invocava despachos e catimbós, fonte de tantas superstições. E chamam isso de fé.

Fonte:http://teste.brasilportais.com.br/blog-literario/6

FREI JUNÍPERO PEREIRA

(Gregório Pereira da Cunha)
Nasceu: 03 de janeiro de 1900 em São Pedro do Cariri-CE
Faleceu:24 de junho de 1986 em Juazeiro do Norte-CE



Ainda jovem, com 27 anos, foi acolhido como postulante no Convento do Sagrado Coração de Jesus em Fortaleza. Fez sua primeira profissão no dia 26 de agosto de 1939. Residiu em todos as casas trabalhando na cozinha, no refeitório, na horta e na portaria. No começo de 1979, já ancião, foi transferido para Juazeiro do Norte-CE, onde ele próprio testemunhava dizendo: “passo o dia rezando”. “Estou me penitenciando”. Pouco se sabe sobre a vida escondida deste confrade, um testemunho de um contemporâneo seu é de que: “era um homem de oração e um bom cozinheiro.

Faleceu aos 86 anos de idade.

Fonte: http://www.procepi.org.br/necrologio.php

quarta-feira, 5 de maio de 2010

PEDIDO DE SOCORRO

Meu avô Marcos Gonçalo, contou-me que certo dia estava ele sentado ao lado de sua casa no São Lourenço, no silêncio da tarde sertaneja, com o sol ainda em brasa, quando notou um som estranho - parecido com o ruído de uma buzina de carro - vindo do alto da Serra do Pilão. A zoada repetitiva trazia supostamente um pedido aflito de socorro, como se um veículo estivesse no prego ou coisa pior.

O tempo foi passando e ele resolveu procurar alguém – talvez uma pessoa mais jovem – que pudesse subir e verificar o que estava acontecendo, já que o lugar de onde vinha o sinal não tinha moradores.

Vasculhou as casas e os terreiros mais próximos e não encontrou ninguém. O sábado era assim, os poucos carros que existiam na ribeira saiam de manhã levando o povo todo para feira de São Pedro, retornando só a tardinha com o sol frio.

Foi preciso tomar outra atitude, com seus quase 80 anos, tinha que fazer aquele percurso desgastante. Botou um chapéu, vestiu a camisa, e saiu com passadas exaustivas no sol escaldante da caatinga, para chegar - quase uma hora depois - debaixo de um pé de aroeira centenário que ficava exatamente na cabeça da ladeira e verificar que o som era produzido por um menino soprando um chifre. Não quis conversa, antes de retornar, tomou o objeto e o sacudiu numa grota funda e espinhenta do Riacho do Mel. O menino ficou em silêncio, assustado, sem entender o que acontecia.

quinta-feira, 18 de março de 2010

Eleições de 76

Diferentemente do pai – que se elegera quatro vezes seguidas para vereador apoiando o grupo liderado por Carlos Morais -, Gregório Alves da Cunha candidata-se para o Legislativo Municipal pelo partido oposicionista. Sua trajetória política é formada por sucessivas vitórias. Na Câmara, defende expressivamente os interesses das classes mais pobres, especialmente dos moradores das comunidades do São Lourenço e circunvizinhanças, embora seu partido seguidamente não consiga êxito nas eleições para prefeito e vice.

Apesar dos incitamentos da política caririaçuense do início dos anos 70, Gregório preserva os velhos laços de amizade dentro da base partidária liderada por Raimundo Bezerra Lima, conhecido por Mundeza, ao qual seu pai Marcos Gonçalo Sobrinho era correligionário. Seu compadre e amigo Belizário Clementino Ferreira, prefeito da cidade, não consegue mudar o pensamento oposicionista do jovem vereador, que apesar de ter herdado formação política do pai, continua com o desejo insistente de mudança.

Para o mandato seguinte, que se estende até o ano de 1976, centenário do município, é eleito Mundeza para prefeito, declarado não-simpatizante da política implantada pelo deputado juazeirense Adauto Bezerra de Menezes, que posteriormente seria escolhido Governador do Ceará pelo general Geisel e referendado pelos votos da Arena - partido de sustentação do regime militar vigente - em eleições indiretas no ano de 1974.

O coronel Adauto começou sua carreira política em sua cidade natal Juazeiro do Norte a terra do Padre Cícero, integrando uma das mais importantes famílias da região do Cariri, situação que sem duvida, contribuiu para que ele se elegesse deputado estadual em três pleitos: 1958, l962 e 1966. Nas eleições seguintes alçou vôos mais altos, sendo eleito para a Câmara Federal e em seguida, como já falamos, foi escolhido Governador.

Não parou por aí sua carreira política, visto que, mais uma vez, foi eleito deputado federal em 1978 e vice-governador em 1982, quando voltaram a acontecer eleições diretas para os governos estaduais, nas quais foi eleito Gonzaga Mota com apoio dos coronéis Virgílio Távora, César Cals e Adauto, que assinaram, em março de 1982, o Acordo dos Coronéis ou o Acordo de Brasília.

Como conseqüência da bem articulada estrutura política montada pelos irmãos Bezerra, a vitória da Arena, em 1976, é esmagadora, elegendo 95% dos prefeitos do interior, enquanto sobram minguados 5% para o MDB. O governador Adauto Bezerra cria a Secretaria para Assuntos Municipais, a qual é entregue ao seu irmão Humberto e torna-se um importante meio de controle sobre as prefeituras dos municípios do interior. Caririaçu sai do domínio dos Morais, com a derrota de José Morais de Carvalho e a vitória da chapa de oposição encabeçada pelo construtor Raimundo Rodrigues Sobrinho, tendo como vice Clemente de Araújo Borges.

Vereadores eleitos em 1976: Moises Fernandes de Lima; José Benedito da Silva; Francisco Barros Marinho; Generino Trajano Feitosa; Gregório Alves da Cunha; José Agostinho de Freitas; Pedro Campos da Silva; José Roque Neto e Pedro Gomes de Lima;

sexta-feira, 12 de março de 2010

SOBRARAM APENAS OS CHOCALHOS

Uma grande seca dizimou todo o gado de Marcos Pereira. Ficaram apenas algumas pencas de chocalhos amontoados. Um compadre aconselhou o velho a vender os apetrechos, pois era muito difícil recuperar àquele rebanho.

Marcos ficou muito triste, passando a viver cabisbaixo, olhando os currais vazios e as cercas em total abandono. Uma desolação de fim de vida, que dava a paisagem sertaneja uma melancolia de cemitério abandonado. Pensava no trabalho que teve durante anos e anos trabalhando sob o sol escaldante da Carnaúba e do Bom Jesus, com a ajuda dos filhos, para juntar aquele gado e de uma só vez a estiagem levara tudo.

Como toda região do semi-árido nordestino, o sul do Ceará é sujeito a períodos de estiagem. Quando faltam as chuvas, as correntes de água param de correr e a seca marca a sua presença severa. Com a volta do precioso líquido, a paisagem muda muito rapidamente. As árvores recuperam as folhas, o solo fica forrado de pequenas plantas, a fauna recupera suas forças, os rios e riachos voltam a correr, as lagoas e açudes transbordam e a temperatura baixa.

Em um encontro que teve com o Padre Cícero na Serra de São Pedro, o chefe do clã Pereira revelou ao patriarca a situação de desalento que as constantes secas provocavam na região da Carnaúba, onde a principal atividade era a criação. Mesmo com o retorno das chuvas os donos de terras não dispunham de recursos suficientes para se recuperarem dos prejuízos provocados pelas secas dos últimos anos do Século. Falou também da opinião do compadre, mandando vender a chocalhada.

O reverendo pediu paciência e acrescentou que iria mandar algumas cabeças de gado para ele criar em suas terras e o trabalho seria pago com uma parte da produção. O rebanho passou muito tempo em sua propriedade. Quando o pasto ficava escasso, os animais eram levados para uma propriedade do Padre Cícero na Serra do Araripe. Passaram-se os anos e Marcos Pereira orgulhava-se de contar essa história. Dizia aos netos que os chocalhos tornaram-se poucos.



































segunda-feira, 1 de março de 2010

A morte de Elias Paes


A roça e a criação de gado tornaram-se as principais atividades econômicas dos moradores da Ribeira do São Lourenço desde o início do povoamento. Algumas fruteiras como a banana representaram grande fonte de geração de renda familiar, onde a cana-de-açúcar destinada aos engenhos de rapadura também muito contribuiu para o desenvolvimento da comunidade até meados do século passado.

Tenho muita lembrança do sítio do meu avô. Eu ainda menino recebia com alegria o convite do meu pai para ir até o São Lourenço nos finais de semana. Ao chegar na sombra da cajarana da casa antiga, com o geep ainda parando pulávamos do veículo e saímos correndo em busca do baixio. Muitas vezes papai dava um grito fazendo com que a gente voltasse para dar a bênção ao avô e aos tios que ali se postavam a espera do encontro. Nosso avô respondia sempre o pedido de proteção com um meigo Deus te faça feliz.

Descíamos a ladeira numa velocidade muito grande. Queríamos pular no rio porque o tempo era curto. Depois do banho, seguíamos para o sítio do outro lado do curso da água onde éramos recebidos por uma diversidade de fruteiras. Não demorava e vô descia e aos poucos observava nosso comportamento. No começo alguns menos adaptados voltavam-se e de longe esperava a reação do velho, outros já acostumados com sua presença continuavam com as brincadeiras.

Não demorava e nosso avô vendo que estava tudo na paz, voltava para casa, sempre deixando alguma recomendação: tenham muito cuidado ao subir nas árvores; cuidado com esse pula-pula dentro do rio que é perigoso. Mais nunca reclamava das frutas que consumíamos, a não ser se estivéssemos jogando pedra para derruba-las.

Quando retornávamos tia Necy já estava com o almoço pronto. Depois, com o sol escaldante ficávamos nas sombras das árvores arrodeando os mais velhos, escutando as anedotas. Em uma dessas meu pai relembrava a história da falsa notícia da morte de Elias Paes que ao viajar à Bahia passou muito tempo sem mandar notícias e os parentes foram informados de que o mesmo teria morrido enquanto trabalhava numa fazenda lá nas bandas do Rio São Francisco. O seu irmão de nome Miguel ao chegar em casa encontrou a mãe muito aflita e aos prantos pedindo ajuda a Deus e a Todos os Santos porque ela não saberia resistir a tão triste notícia. Miguel vendo aquela situação ficou surpreso com o estado de revolta que sua mãe se encontrava, pois ela tinha passado por dificuldades piores e não tinha ficado daquele jeito, então perguntou: Mãe, eu não sabia que a senhora gostava tanto de Elias? E ela: É por causa da minha rede novinha meu filho que ele levou, acho que deram sumiço a ela!

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

A PARTILHA

João Marcos era rapaz velho e durante algum tempo, já com a idade bastante avançada ficou muito doente. Não falava, não dava sinais de melhora e os familiares juntamente com os moradores das localidades próximas do sítio Carnaúba, todos os dias prestavam-lhes solidariedade fazendo sentinela em sua residência.

Numa determinada noite, em conversa reservada próximo a janela do quarto onde o doente se encontrava, alguns parentes mais próximos - não imaginando que o enfermo pudesse escutar - traçavam a repartição do patrimônio do doente. No diálogo, os herdeiros antecipavam o processo de partilha dos bens apontando inclusive os riachos que compreenderiam a linha divisória das terras.

No dia seguinte, o velho João, quase morto, teve uma melhora e pediu que um portador fosse até o município de Farias Brito atrás do tabelião do cartório e com a chegada deste não hesitou e pediu que o homem preparasse um documento dando ensejo de doar todos os seus bens para a Igreja, evitando assim, que os pretensos herdeiros praticassem a propositada partilha.

Nota: João Pereira da Cunha conhecido por João Marcos era filho do casal Marcos Pereira da Cunha e Dona Maria Ferreira.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

A VACA BOA



O velho Simplício Gonçalo não mentia. Posso afirmar com segurança, pois a história não me deixa excluir essa característica daquele homem. Certa vez o Major vendeu uma vaca a um primo. No Sábado resolveu ir à São Pedro fazer a feira. Quando passava numa determinada rua da cidade, foi surpreendido por uma pessoa, que de longe o chamava para confirmar uma história. Era o primo tentando vender o animal a outra pessoa. Pediu para que o suposto comprador perguntasse ao major se a vaca realmente não era boa. Antes que o homem fizesse qualquer indagação, Simplício respondeu dizendo que vendeu a vaca com as condições de que era muito ruim, pulava cerca, não dava leite e para completar era muito valente.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

MINHA ESTRELA




Pedro Cunha/Serra de São Pedro/Caririaçu/CE 2008


Temos um pequeno sítio na Serra de São Pedro a 8 km de Caririaçu. Um lugar tipicamente igual aos outros da redondeza. Uma pequena casa de tijolo com quatro cômodos, banheiro e alpendre. No terreiro algumas fruteiras: caju, manga, banana, catolé, goiaba – e uma diversidade de plantas adquiridas no comércio de Juazeiro e Barbalha.

Compramos o terreno na intenção de voltar ao passado. Já tínhamos morado no sítio São Paulo, mas meu pai acabou vendendo a propriedade e a saudade daquele tempo de infância conduziu meu destino.

A convivência com a natureza e com as pessoas da comunidade me trouxe um conhecimento indispensável ao homem da terra. Aquele povo simples carrega um aprendizado não encontrado na escola propriamente dita.

Acredito na sabedoria dos profetas populares e apesar de ultimamente constatar divergências nas opiniões de alguns, surpreendo-me com a inteligência e o poder de observação desses homens, muitas vezes obrigados a decifrar os encantos da natureza e com isso aumentar naturalmente a possibilidade de sobrevivência num espaço cheio de dificuldades, onde a relação homem e ambiente precisa de maior entendimento.

Outro dia Zé Galdino - um velho que mora lá perto, nas bandas da Extrema -, me falou de previsão do tempo. Disse que era um ano propício para se plantar arroz, porque um ano par é sempre bom, e além do mais todas as experiências eram favoráveis, inclusive os caçadores tinham encontrado muita caça prenha – o trágico demonstrando um bom sinal. Naquele ano vivemos literalmente um dilúvio e nossa cidade ficou totalmente ilhada por alguns dias.

Com o conselho do amigo resolvemos fazer o teste e plantamos uma pequena roça de arroz, milho e feijão, onde conseguimos colher uma quantidade satisfatória. As enchentes aconteceram exatamente no período em que minha filha estava para nascer, tinhamos que levar minha esposa ao Juazeiro, era uma gravidez complicada e a ponte do Rio Carás que dava acesso aos dois municípios acabara de cair, então tivemos que enfrentar uma passagem arriscada pela estrada dos Carneiros aproveitando a diminuição das águas no final da tarde. Naquele momento, passando na estrada velha do sítio Carás lembrei-me dos relatos do Padre Antonio Vieira – o protetor do jegue -, que escreveu sobre meu bisavô materno José Gonçalves dos Carás, dizendo que na época em que o padre estudava no Crato e tinha que atravessar o rio cheio, o velho Gonçalves dava total apoio na travessia e depois em sua casa. Tornaram-se compadres e grandes amigos.

No mesmo dia Joana Maria nasceu e teve que ficar alguns dias numa incubadora. Fiquei fazendo o percurso Caririaçu Juazeiro todos os dias para realizar minhas visitas e no trecho da ponte, lembro-me bem, eu ficava rindo, ironizando a situação, tendo que passar numa balsa feita de uma espécie de tambor de 200 litros, com quatro de cada lado, algumas tabuas na parte superior e uma corda que era puxada por meia dúzia de homens contratados pela empresa de ônibus que fazia a linha.

Vejamos um trecho da notícia das chuvas divulgada pelo Jornal O Povo – Edição de 17 de Fevereiro de 2004:
”Duzentos e oito milímetros de chuvas entre domingo e ontem deixaram o município de Caririaçu isolado, e sem abastecimento d'água. As precipitações registradas pela Funceme, no Cariri, no período, também voltaram a causar estragos em cidades que já tinham sofrido danos com as chuvas de janeiro último. Em 11 localidades da região, as chuvas foram superiores a 100 milímetros
A região do Cariri, que concentrou as maiores chuvas registradas pela Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme), entre a manhã do último domingo e a de ontem, voltou a sofrer prejuízos com as fortes precipitações. Em 11 postos de monitoramento dos índices pluviométricos mantidos pela Funceme na região do Cariri, foram registradas chuvas superiores a 100 milímetros no período. A maior delas, de 208 milímetros, deixou isolado Caririaçu, a 592 quilômetros de Fortaleza. A cidade está sem abastecimento d'água, uma vez que a área de captação do líquido, ficou inundada.
Conforme diz Zuli Morais, filha da prefeita Lúcia Vanda de Morais, todas as estradas estão interditadas, e há risco de arrombamento de três açudes de grande porte. Barreiras caíram na rodovia estadual que liga Caririaçu a Juazeiro do Norte, 563 quilômetros distante da Capital, outro município que também está em situação crítica devido a uma chuva de 166 milímetros nos últimos dois dias. Com o agravamento dos danos, Juazeiro registrou quedas de pontes e alagamentos de áreas como a do Horto, Favela Boca das Cobras, Alta Tensão e Lagoa Seca. Ontem foi necessária até a ajuda do helicóptero do Ciopaer (Centro Integrado de Operações Aéreas) para a retirada de moradores das regiões afetadas”.


Felizmente, no dia 07 de março fui informado de que no dia seguinte minhas mulheres poderiam voltar para casa. Foi uma festa, primeiramente tivemos que enfrentar de carro a estrada do Taquari. O tempo encharcado, muita lama. Nessa altura a maioria dos agricultores que viviam nas terras baixas dava tudo por perdido. A água tinha devassado os baixios. O caririense costuma plantar nas primeiras chuvas, não quer perder tempo, se for preciso planta tudo novamente, mas as chuvas não paravam. O sertanejo, apesar de tudo vivia sorridente, preferia sofrer com a água ao invés da seca. A situação dos que viviam na serra, como era o nosso caso, era diferente, pois a chuva mesmo em excesso não prejudicava tanto, ficávamos apenas pensando na situação dos que moravam nas comunidades baixas, principalmente os familiares do São Lourenço.

Ao chegarmos a Caririaçu passamos primeiro na casa de minha mãe na Rua Coronel Botelho. Meu outro filho Felipe tinha 14 anos e morava na cidade, onde estudava. Ficou ali ao lado da cama, admirando a irmã. A casa logo ficou cheia do pessoal da vizinhança: as meninas, as moças, as velhas, cada qual com sua opinião.

Ao cair da tarde seguimos para o sítio. Eu queria mostrar para ela a nossa casinha, nossa vida simples, queria que ela entendesse tudo aquilo que estava acontecendo entre nós. A casa estava diferente - comentou Lucinha. Tínhamos organizado tudo. Reformamos a casa com a ajuda de Colega - um trabalhador da Ribeira do São Lourenço filho de Chiquinho do finado Pedro Velho que morava com a gente. Consertamos as cercas perto da casa, limpamos o terreiro, empilhamos a lenha e foram feitas novas casas para os bichos. Galinha, bode, porco, pavão, ovelha, cachorro, todos acabaram ganhando com as boas vindas. Entramos e o quarto já estava ajeitado, o berço, uma prateleira branca com alguns objetos para recém-nascido, nossa cama ao lado e um pequeno guarda-roupas. No outro cômodo, que chamávamos de sala de janta ficava a televisão, uma mesa redonda com quatro cadeiras, geladeira, fogão a gás, uma cadeira de balanço e uma preguiçosa. O alpendre ficava aos fundos dando cobertura a um fogão de carvão e uma pia de lavar pratos. Visinho ao quarto ficava um banheiro. Ao entrar na porta da frente dois pequenos cômodos, um era a sala do Santo, onde ficava também além do computador, uma velha cadeira de balanço centenária presente de minha tia Bárbara de saudosa memória que falecera há poucos meses. No cômodo visinho ficavam alguns livros e revistas e um baú antigo. Aquele repartimento servia também de dormitório do Colega. Na parede alguns quadros, dois destes, um de meu pai e outro de Felipe, - pintados por mim. Fotografias do meu pai e de Luiz Gonzaga tinham muitas, inclusive um quadro do Rei do Baião em pedra de Santana, presente de minha amiga Lúcia Vanda.

A notícia andou depressa e conforme o costume sertanejo os amigos começaram a chegar. Primeiro chegou comadre Terezinha, depois veio Dona Maria e Seu Nezinho, Damiana, o pessoal do Sítio Sales, da Extrema, Dona Rosa e Seu Doca lá da Cangaia para completar a animação. O assunto começava em mulher “buchuda”, passava pela política, falavam em recém-nascidos, no dia da mulher, mais só terminava em água. O inverno só ali pertinho tinha carregado à parede da lagoa de São Paulo e o açude de Zé Adauto. Essas águas tinham caído todas dentro do açude do Modebrão, que ficava mais a baixo. E o ruim da história: ele estava quase indo embora. Se acontecesse essa tragédia, o que seria dos familiares do São Lourenço.

Depois o povo despediu-se e aos poucos um silêncio frio predominou no terreiro e dentro da casa o inverso. Na madrugada acordei para conferir, era difícil acreditar, minha filha estava ali pertinho, naquela paz. Na calçada observei o céu e agradeci. Trovões e relâmpagos cortavam o universo mostrando que do lado de fora não tinha sequer uma estrela.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

O DIA DO NOIVADO DE PEDRO FERREIRA

Durante os levantamentos que fizemos conversando com pessoas de nossa família nos deparamos com histórias que chamam à atenção de todos. Tenho saudade das conversas que tive com D. Antonia Tavares. Ela tinha uma capacidade enorme de memorização de datas e fatos, e isso, aliada ao interesse dela pelo assunto, naturalmente, a transformou numa peça fundamental para elucidação genealógica de algumas famílias estabelecidas no município de Caririaçu. Infelizmente, embora tenhamos reconstituído através dela boa parte do nosso passado, com sua morte muita coisa deixamos de conhecer, em virtude de não termos melhor aproveitado sua lucidez constante.
Dona Toinha contou-nos certa vez que ouvira falar dos mais velhos que seu bisavô Pedro Ferreira era casado com uma prima de nome Sinhara. No dia do noivado ele viajou a cavalo algumas legras até o sítio Farias em Barbalha para conhecer sua futura esposa, que poderia ser qualquer uma das primas solteiras, dependendo basicamente de sua escolha.
Logo nas primeiras conversas com o sogro, Pedro pediu que arranjassem fogo para ele acender um cigarro. Prontamente foi solicitado que alguém atendesse o pedido do jovem visitante. Em pouco tempo adentrou a porta uma linda moça de cabeça baixa e tímida. Na mão trazia um tição que foi deixado às pressas na sala. Com o passar das horas Pedro foi convidado a conhecer as filhas do casal, mas ele retrucou dizendo que tinha se agradado da moça do fogo.

Nota: Na conversa que tivemos com D. Toinha ela comentou sobre as dificuldades que as pessoas tinham na condução das atividades diárias, referindo-se ao fato de Pedro Ferreira apesar de ser um homem abastado, não conduzia um utensílio para acender seu cigarro.
Este fato deve ter acontecido nas primeiras décadas do Século XIX.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

PATRIMÔNIO SERTANEJO

De Marcos Gonçalo só tenho lembrança boa. Era um velho manso e muito educado. Tinha o costume diário de sentar ao lado de sua casa velha de tijolo e taipa comum no sertão numa cadeira feita de "piquiá" e couro de gado. Atentamente observava a mata à frente com o seu pé de aroeira demarcando as terras na cabeça da Serra do Pilão. Um rádio preto tocando um som de violeiro ficava em cima da mesa de cedro antiga ao lado da reiúna na parede dividindo o espaço com o passado fotográfico da família. Uma rede embolada no armador de pau fazia companhia a outros acessórios da luta diária com o gado e a roça, onde tudo e todos eram partes do mobiliário sertanejo. O tempo era tão quente que fervia o chão de São Lourenço e o velho ansioso aguardava notícias do seu povo. O sol ia embora e a sombra da "cajarana" tomava conta do terreiro, acendia um cigarro e contava causos do seu tempo: as brigas, amizades, as viagens que fazia a cavalo tirando retrato nas festas de casamento, do Padroeiro São Sebastião de Dom Quintino do Crato, Várzea Alegre, Iguatu, Jaguaribe e tantos outros lugares deste Cariri de Padre Cícero. Falava da vez que amarrou um valentão que acabara de matar um homem na porta da igreja da Valença enquanto o padre de São Pedro celebrava a missa de São Vicente Ferrer.
Meu avô era assim, igual a tantos outros, um patrimônio sertanejo de ascendência pobre com raízes nobres. Estudou pouco e conseguiu aprender, era considerado por toda aquela gente como sendo um homem inteligente e com grande experiência de vida. Poucos sabiam ler ou escrever e as cartas que chegavam eram traduzidas por ele com muita emoção e total envolvimento.

domingo, 20 de setembro de 2009

VEREADOR MARCOS GONÇALO SOBRINHO

,
Filho de José Gonçalo Sobrinho e Raquel C. de Jesus, nasceu no dia 7 de agosto de 1912 no sítio São Lourenço município de São Pedro do Cariry
Foi eleito vereador quatro vezes, onde se destacou defendendo expressivamente os interesses do município de Caririaçu.
Em pesquisa procedida no arquivo do Poder Legislativo, constatamos no Livro de Atas o dia da posse de Marcos Gonçalo em seu primeiros mandato como vereador. Em seguida transcreveremos o ato, em seu inteiro teor:

“Ata de instalação e de posse dos Vereadores que constituem a Câmara Municipal de Caririassu.
Ao primeiro dia do mês de janeiro do ano de mil novecentos e quarenta e oito, às treze horas, previamente designada pelo Sr. Juiz Preparador Eleitoral, no salão Paroquial, desta cidade de Caririaçu, da Comarca de Juazeiro do Norte, Estado do Ceará, onde presentes se achavam, o cidadão José Vitorino da Silva, Juiz Preparador e grande assistência popular. O Sr. Juiz Preparador, declarou aberta a Sessão, convidando a unir Francisco Gentil das Chagas, para secretariar. Em seguida fez a chamada dos Vereadores legalmente diplomados: Alvaro Pereira da Cunha, José Batista Vieira, Antonio Ferreira Bilar, Sebastião Alves Feiotsa, Vicente Firmino Vieira, Francisco Barros Sobrinho, Marcos Gonçalo Sobrinho, Raimundo de Lima Morais e Valdimiro Correia de Araujo, aos quais foram convidados pelo Juiz para ladear a mesa. Verificando-se a presença de todos os Vereadores eleitos, o Sr. Juiz Preparador Eleitoral procedeu na forma da Lei as eleições para Presidente da Câmara e respectivo Secretário, sendo eleito José Batista Vieira e Sebastião Alves Feitosa respectivamente presidente e Secretário, ao final do resultado houve forte salva de palmas. O resultado dessas eleições foi a seguinte: Para Presidente da Câmara o Vereador José Batista Vieira obteve sis (6) votos: o Vereador Vicente Firmino Vieira, dois (2) votos e o Sr. Vereador Raimundo de Lima Morais, um (l) voto. Para Secretário da Câmara, foi eleito por unanimidade o Vereador Sebastião Alves Feitosa. Ato continuo, o Sr. Juiz Preparador depois de parabenizar o povo de Caririassu, proclamou-os eleitos e convidou o Sr. Presidente eleito a assumir a presidência da Sessão. Em seguida sob a presidência do Sr. José Batista Vieira, foi por ele facultada a palavra, usando da mesma sob salva de palmas o cidadão Raul Milton, que em ligeiras palavras felicitou a Câmara recém empossada incitando os Vereadores ao cumprimento de seus deveres. Após usar da palavra o Vereador e Secretário da Câmara, Sebastião Alves Feitosa, que congratulou-se com o povo de Carriassu, em seu próprio nome, em nome do Partido Social Democrático pela assistência do pleito, prometendo corresponder a confiança do eleitorado, esperando contar com igual atitude de seus colegas da União Democrática Nacional. E como mais não houvesse quem usasse da palavra e nada mais havendo a tratar, mandou o Presidente que fosse lavrada a presente que vai devidamente assinada. Eu, Francisco Gentil das Chagas, servindo de Secretário a escrevi e assino.”
(Livro de Atas, aberto em 29 de Junho de 1936, pelo Presidente da Câmara Domingos de Oliveira Borges).

sábado, 12 de setembro de 2009

O MAJOR NÃO MENTIA

Certa vez funcionários de um banco de Juazeiro procuraram o Major Simplício Gonçalo em sua residência no sítio Cacimbras para que ele pudesse dar informações de algumas pessoas da região que teriam feito cadastro na agência com o intuito de adquirir empréstimo rural. Na relação constava o nome de uma pessoa que Simplício afirmou ser um indivíduo que não gostava da cumprir seus compromissos. Não pagava as contas, não tinha palavra, mentia e acima de tudo, se fosse para levar vantagem enganava a própria sombra. Falou tão mal que o funcionário do banco quis saber se o pretenso cliente morava ali perto e o velho respondeu: É aquele camarada que estava aqui escutando nossa conversa... quando comecei a falar ele se retirou.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

BARTHOLOMEU FERREIRA DA SILVA X CORONEL JOSÉ BELÉM DE FIGUEIREDO: O COMBATE QUE NÃO SE TRAVOU


ILUSTRAÇÃO: Bartholomeu/Pedro Cunha



Bartolomeu Ferreira nasceu em 1846 no Sítio São Lourenço, município do Crato. Era filho de Pedro Ferreira e D. Sinhara ou Dindinha, como também era conhecida. Casou-se com Maria Madalena e tiveram José, Pedro, Maria do Carmo, Luca, Maria e Joaquinha. Conseguiu interferir na demarcação ilegal de terras feita pelo Coronel José Belém de Figueiredo, audacioso chefe político do Crato. O destemido coronel ao chegar à divisa das terras que hoje pertencem a Raimundo Araújo da Costa, conhecido por Mundinho de Odilon, seguido por uma dezena de jagunços fortemente armados, foi informado da presença de Bartholomeu, que estava acompanhado de Joaquim Barbosa de Milagres – conterrâneo de Belém, e que também era conhecido pelo seu comportamento esquentado. Felizmente o combate não se travou. O coronel mudou o rumo e graças a este episódio o São Lourenço continuou nas mãos dos seus verdadeiros donos, diferentemente de outras localidades circunvizinhas onde os pequenos proprietários não tiveram a mesma sorte, foram obrigados a vender suas glebas de terra por preços bem inferiores ou então seriam expulsos sem nenhum direito. Na conversa com Bartolomeu, Belém disse que já o conhecia, já ouvira falar de sua coragem, inclusive da vez que ele teria trazido uma mulher morta na garupa do cavalo, do Bom Jesus ao São Lourenço, amarrada com um lençol e o queixo batendo nas costas.


Nota: Conforme depoimentos orais, a mulher transportada por Berto chamava-se Berbela. Era ela quem fazia partos na região do São Lourenço e Bom Jesus. Outra informação que precisa ser checada é que ela pertencia a um grupo de escravos adquiridos por Pedro Ferreira e posteriormente beneficiados com a liberdade.







sábado, 5 de setembro de 2009

PADRE CÍCERO: O QUARTO VIGÁRIO DE SÃO PEDRO


A paróquia de São Pedro foi criada em 9 de novembro de 1870 pela Lei Provincial 1362. Só mais tarde, no dia 18 de abril do ano seguinte saiu a provisão canônica assinada por D. Luiz Antonio dos Santos. O Padre Manoel Carlos da Silva Peixoto foi nomeado o primeiro vigário e após dois anos junto a freguesia foi substituído pelo padre Manoel Rodrigues de Lima que ficou durante dez anos. O terceiro vigário – João Carlos Augusto natural de Lavras da Mangabeira foi nomeado em janeiro de 1884, ficando à frente da paróquia até o dia 21 de setembro de 1888, mesma data em que foi nomeado o padre Cícero Romão Batista que tomou posse no dia 29 de janeiro de 1889 e exerceu as funções durante quatro anos aproximadamente. Nos domingos e dias santos celebrava missa pela manhã na Capela de N.S. das Dores em Juazeiro e seguia para São Pedro onde celebrava e passava o resto do dia fazendo batizados, casamentos e confessando fieis, só regressando à tardinha.
Cumpre não esquecer que o Padre Cícero, sempre foi, intimamente, um monarquista. Quando se deu a proclamação do regime republicano no Brasil, ele era vigário da Paróquia de São Pedro do Cariri, ficando indignado com este acontecimento. A vitória republicana, segundo o pesquisador Aldenor Benevides – proporcionou ao padre, uma tal revolta, a ponto de, pouco tempo depois, um republicano de nome Dr. Francisco Marçal da Silveira Garcia, ex-juiz do Crato, indo a São Pedro do Cariri acompanhado de alguns militares, numa campanha contra o imperador, ter dado lugar a que o Padre Cícero, por ocasião da missa dominical fizesse um sermão contra o novo regime. Naquela prática pediu que ninguém acompanhasse o Dr. Garcia e nem tampouco temesse os seus soldados porque em São Pedro do Cariri quem mandava era ele, Padre Cícero.
Dois meses após ter tomado posse como vigário da cidade serrana no dia 1º de março um fato extraordinário transformou a rotina do Juazeiro, onde o reverendo morava. Naquela data, ao participar de uma comunhão reparadora, oficiada por ele, uma bata muito piedosa, chamada Maria de Araújo, ao receber a hóstia consagrada não pôde degluti-la porque a mesma se transformara em sangue diante dos olhos de todos. A notícia correu e, em pouco tempo, legiões de pessoas vinham de longe para assistir de perto ao fenômeno. Apesar de ter sido testemunhado por muitas pessoas dignas, mais de uma dezena de padres da região e ter sido atestado por dois médicos e um farmacêutico como sendo um fato sobrenatural, a Igreja nunca considerou o sangramento da hóstia como milagre. Mais tarde, os chamados Milagres do Juazeiro passaram a ser estudados por diversos cientistas sociais no Brasil e no Exterior e Juazeiro do Norte, por ser uma cidade mística, tem sido objeto de vários documentários, o que faz muito conhecida e famosa. O fato chamou a atenção do povo sofrido do Nordeste. Os romeiros invadiram Juazeiro, sob a proteção de Nossa Senhora das Dores e da fama da santidade do Padre. Algumas famílias vieram para ficar e muitas delas foram enviadas pelo sacerdote para a Serra de São Pedro e outras terras de boa fertilidade da região. Mesmo com as pressões de Roma, Padre Cícero continuou celebrando em Juazeiro ainda ficou como vigário de São Pedro do Cariri até o dia 6 de agosto de 1892. Durante toda sua vida ele tentou revogar a pena aplicada pela Igreja Católica, todavia, foi em vão. O resultado de tudo isso foi que jamais se provou que a transformação da hóstia em sangue era uma farsa.
O AMIGO
Temos em mãos o conteúdo de uma carta enviada pelo Padre Cícero a Marcos Pereira. Este documento foi reproduzido pela senhora Adalgisa Borges, e serve como prova inconteste do laço de amizade que existia entre Marcos e o Patriarca do Nordeste:

“Horto, 28 de Abril de 1906

Abençoado e bom amigo Marcos

A paz do nosso Senhor Jesus Cristo o guarde

Como sempre pretendia ir hoje mais tendo amanhecido uma constipação ontem que pôs-me rouco, tomei umas pílulas purgativas que somente amanhã a tarde querendo Deus estarei aí, não posso ir celebrar em São José.
Não repare o ter enganado. Velho não tem carreira.

Disponha sempre do seu amigo velho

Pe. Cícero Romão Batista.”


A FÉ
O livro Padre Cícero e Juazeiro do escritor Aldenor Benevides traz o registro de um acontecimento que demonstra a importância do Patriarca do Nordeste no contexto familiar, sobretudo pela força espiritual transmitida pelo sacerdote:
“Contou-nos João Evangelista de Aquino, mais conhecido por Listrinho, agricultor em Caririaçu, 80 anos, quando conversávamos sobre o Padre Cícero Romão Batista e Juazeiro do Norte. Dois dos seus cunhados, quando meninos, no Sítio Olho D’água, no município de Caririaçu, entre os anos de 1910 e 1920, não lembra-se bem, foram mordidos por um cão raivoso. A mãe das crianças, conhecida por D. Cota, dirigiu-se às pressas até Juazeiro do Norte a fim de pedir ao Padre Cícero que salvasse os filhos, uma vez que São Pedro do Cariri, naquele tempo, não tinha sequer, uma farmácia. O sacerdote recomendou-lhe adquirisse massa de milho e com a mesma fizesse bolinhos levando-os em seguida para os mesmos serem por ele abençoados. Quando voltou, D. Cota ficou emocionada com a linda prece que o Padre Cícero pronunciou benzendo os bolinhos que foram todos eles consumidos pelas crianças que nada sentiram da ameaçadora doença. A criança do sexo feminino viveu muitos anos e deixou vários netos. A outra, do sexo masculino, ainda existe e reside no município de Caririaçu.”

Nota: As crianças citadas no livro eram Alexandrina e Augusto.


UMA GRANDE SECA
Conforme Augusto Pereira, certa vez o seu avô Marcos, saiu da Carnaúba para o Juazeiro, a fim de falar com o Padre Cícero. Queria lhe pedir uma benção e também um conselho, pois, não suportava mais a terrível seca que sufocava o Cariri. Seu açude não tinha mais água, e o gado já não tinha o que beber. O padre pediu para que ele tivesse paciência e deixasse para retornar no dia seguinte. Quando chegou o outro dia, o sacerdote novamente insistiu para que ele ficasse mais um. Mesmo sem entender, Marcos aceitou o conselho. Quando retornou foi pego de surpresa, tinha chovido muito na Carnaúba, Bom Jesus e proximidades e o seu açude estava sangrando.

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